sexta-feira, 26 de maio de 2017

Brasil - O país da hipocrisia


"A cidade é um monstro onde as epidemias se albergam dançando sabats magníficos, aldeia melancólica de prédios velhos e acaçapados, a descascar pelos rebocos, vielas sórdidas cheirando mal, exceção feita da que se chama Rua do Ouvidor, onde o "homem do burro sem rabo", cruza com o elegante da região tropical, que traz no mês de fevereiro sobrecasaca preta de lã inglesa, e dilui-se em cachoeiras de suor.

O povo está sem instrução. A industria desprotegida. Os Serviços públicos, de molas perras. Só o comércio progride, o "honrado comércio desta praça" com o comendador a frente, o quilo de 800 gramas, o metro de 70cm."
 
Luiz Edmundo - In Rio de Janeiro em Prosa e Verso



"Em um século em que se recompensa o talento, a Providência me trouxe a um país onde isso não importa. Sofro os horrores da miséria, e minha cabeça está plena de descobertas. Nenhuma alma me escuta, nem me compreenderia. Aqui só se dá valor ao ouro, só se ocupam de política, comércio, açúcar, café e carne humana. Sem dúvida conheço algumas almas grandes e belas, mas essas, em número muito reduzido, não têm formação na minha linguagem, e eu respeito sua ignorância."

"Como eu tratei pouco da photographia por precisar de meios mais complicados, e de sufficientes conhecimentos chimicos, não disputarei descobertas a ninguém, porque uma mesma idea pode vir a duas pessoas, porque sempre achei precariedade nos factos que alcançava, e a cada um o que lhe é devido."

Hercule Florence - A descoberta isolada da fotografia no Brasil



"Os brasileiros dão ótimos advogados, podendo desta forma aproveitar seu talento declamatório. Dão a vida por falar, mesmo quando é para não dizer nada. Com a a eloquência que esbanjam num único discurso, poder-se-iam compor facilmente dez em nossa terra; embora não possuam verdadeira eloquência nem marcada personalidade, falando todos com a mesma cadência tradicional usada em toda e qualquer circunstância. Tudo é exterior, tudo gesticulação e meia cultura. O fraseado pomposo, a eloquência enfática já são por si próprios falsos e teatrais; mas se você tirar a prova real, se indagar sobre qualquer assunto, não se revelam capazes de fornecer a informação desejada."

"Há pessoas na alta direção do partido republicano que não conhecem a história nem a constituição do país nem muito menos as das outras nações. Há outros, que se dizem partidarios do sistema filosófico do espiritual Comte, mas não compreendem os seus mais elementares ensinamentos. Alguns dão opinião sobre línguas estrangeiras, mas não sabem explicar nenhuma regra da sua própria."


"Querem possuir sem demora todas as novidades no terreno da técnica, mas os engenheiros para a montagem vêm da europa; quando estes se retiram, se por acaso se parte uma das peças das máquinas, nenhum nacional sabe consertá-la. Não se encontra profundidade em parte alguma;..."


"Fala-se muito na emancipação dos escravos e parece que a coisa vai caminhando. Todos os anos o Estado apresenta no orçamento um fundo de resgate; nas províncias, organizam-se sociedades abolicionistas e muitos escravos tornam-se livres por iniciativa própria. Não há duvida que é um lindo movimento, mas quanta lama vem a tona! Quanta sujeira aparece! ... Na provincia do Espirito Santo, há algum tempo, compraram de seus senhores dois escravos com a idade de 69 e 70 anos por mil marcos cada um!


Quem lucrou com isso? Esses pobres velhos cativos, já esgotados, que a morte bem cedo libertaria e que se viam agora arriscados a mendigar seu pão? Ou os seus senhores? ...Em Tatuí, um escravo no último grau de tuberculose foi libertado pelo fundo de emancipação estadual por um conto e quinhentos mil réis. Mas essas e outras trapaças e fraudes não são nada em comparação com a descoberta de que muitos escravos e escravas, já mortos, figuravam nas listas de sociedades abolicionistas, tendo seus ex-proprietários embolsado a soma do resgate, para depois de algum tempo, fazê-los morrer uma segunda e última vez."

 
Os meus romanos. Alegrias e tristezas de uma professora alemã no Brasil.
Livro composto por cartas escritas e enviadas a seus entes por Ina Von Binzer no período que esteve no Brasil, 1881 - 1883.