segunda-feira, 21 de agosto de 2017

Alexandre o grande e os Citas

Contrariamente ao que se diz, Alexandre sabia calar-se e render-se à sabedoria de homens de valor. Disso deu provas nos seus primeiros contatos com a Asia, ao ouvir pacientemente o discurso de um embaixador cita; um grego não ousaria dizer a sua frente metade do que foi dito sem correr o risco de morrer.

Eis o discurso:

"Se a ti os deuses tivessem dado um corpo proporcional as tuas ambições, o universo seria pequeno para ti; com uma das mãos tocarias o oriente e com a outra o ocidente. E não contente ainda seguirias o sol para saber onde se deita.
Tua ambição é maior do que tu. Quando tiveres subjugado todos os homens, farás guerra aos rios, as florestas e às feras.
Porventura ignoras que as grandes árvores custam a crescer e que em uma hora podes abatê-las?
O insensato cobiça-lhes os frutos sem considerar a altura. Atenta pois para não caires em meio aos galhos em que te enredares.
O leão as vezes serve de pasto as aves pequenas e a ferrugem corroi o ferro.
Nada existe que seja tão forte que não possa ser destruido por um conjunto de coisas mais fracas.
Que temos a discutir contigo? Nunca pusemos os pés em tuas terras.
Por que negas aos que aqui vivem, o direito de ignorar a tua presença e o que és?
Não queremos obedecer nem mandar em ninguem, e para que saibas que espécie de gente somos, queremos dizer-te que dos deuses recebemos como dadivas preciosas uma junta de bois, um arado, uma flecha, um dardo e uma taça.
Estes são os nossos instrumentos de paz e de guerra.
Com os amigos partilhamos o trigo obtido com o trabalho dos bois e na mesma taça oferecemos vinho aos deuses.
Quanto aos inimigos, a flecha os abate de longe e o dardo de perto.
Tu te vanglorias de que vieste em nome da justiça para exterminar os ladrões; És o maior ladrão da terra.
Saqueaste e dizimaste as terras sob teu jugo e ainda vens roubar nosso rebanho.
Em tuas mãos ja não cabem mais presas.
Que pretendes fazer de tantas riquezas que somente aumentam tua sede?
Na abundancia tiveste como companheira a solidão.
Para ti a vitoria é a semente de novas guerras.
Nenhum povo se submete ao jugo de um principe estrangeiro.
Prossegue no mau caminho que tomaste e sentirás a vastidão de nossas planicies.
Podes perseguir os citas, duvido que os alcance.
Nossa pobreza nos faz leves e ágeis, enquanto tu terás que carregar o pesado fardo dos despojos das terras que pilhaste e, quando pensares que estamos longe, hás de nos ver sempre a teus calcanhares, pois com a mesma rapidez com que fugimos de nossos inimigos, os perseguimos.
Crê, a fortuna é escorregadia; cuida bem para que não te escape, e difícil será retê-la se ela quiser abandonar-te; põe-lhe um freio antes que ela te seja adversa.
Finalmente, se és deus, como o dizes, apieda-te dos mortais.
Mas se és um homem, pensa sempre no que és, pois é vão alimentar pensamentos que nos afastem de nós mesmos.
Deixa-nos em paz e seremos bons amigos, pois as mais sólidas amizades se fazem entre iguais e não te iludas em ser amado pelos vencidos; entre o senhor e o escravo não pode crescer o fruto da amizade.
Saiba ainda que para selar nossa aliança não precisamos nem de juramentos nem do testemunho dos deuses; pois aquele que não cumpre sua palavra de homem não tem escrúpulo em enganar aos deuses. Podeis então escolher: ter-nos como amigos ou como inimigos".